Como diz a sommeliére Silvia Mascella Rosa, do Ibravin, “uma taça de um bom Cabernet Sauvignon é, certamente, um momento de encontro com a mais importante e tradicional uva tinta do mundo”. Neste mês de agosto, os membros da Confraria Viva o Vinho não só têm um encontro marcado com essa uva, mas também estão convidados a viajar pelo mundo, sentindo todos os sabores e aromas que ela pode nos proporcionar, dependendo do país, do terroir e dos métodos de produção pelo quais passou.

A Cabernet Sauvignon é o tema do 9º Evento da Confraria Viva o Vinho, que acontecerá de 26 a 28 de agosto. E para começarmos a nos preparar para o evento fizemos uma grande pesquisa sobre essa casta e as diferenças em cada região de produção. Assim você já pode ir pensando qual delas te agrada mais e por quais países vai querer viajar. O que acha? Vamos começar a planejar a viagem?

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Drone filmando Vinhedos de Cabernet Sauvignon

A uva mais cultivada do mundo

A mais conhecida das uvas tintas e provavelmente uma das mais apreciadas do mundo é também a mais cultivada. O último estudo disponível, realizado em 2010 pela Universidade de Adelaide, na Austrália, analisou 1.271 uvas em 421 regiões, de 44 países. A conclusão é que a Cabernet Sauvignon está no topo da lista, com 300 mil hectares plantados. O segundo lugar ficou com a Merlot.

Cabernet SauvignonFácil de cultivar, adaptável a uma enorme variedade de terroirs, resistente a muitas pragas e ainda por cima capaz de fazer sucesso sozinha ou nas combinações mais famosas e elegantes do mundo – são muitos os motivos para a Cabernet Sauvignon ter chegado a essa posição.

A casta hoje está presente em praticamente todas as regiões vinícolas do mundo. Da Europa à África, da Ásia até a Oceania, bem como nas três Américas.

Qualquer região ou produtor que esteja começando a colocar seus produtos no mercado a escolhe para mostrar ao mundo do que é capaz. Podemos dizer que a Cabernet Sauvignon é a casta internacional para se avaliar vinhos, produtores ou regiões.

Por onde passa, esta uva deixa seu toque. Mas como e por que a Cabernet Sauvignon se tornou a mais importante casta do nosso tempo? Qual sua origem? Qual seu gosto? O que a torna tão marcante? Quais as melhores regiões produtoras?

Todo esse sucesso se deve, em parte, pela capacidade que essa casta tem de manter suas características, aromas e sabores independentemente da região onde é cultivada. Isso mostrou ser um forte apelo aos novos consumidores que logo a elegeram como padrão de vinho tinto. Mas tem muito mais… e a gente vai descobrir!

Um pouco de história

Pertencente à espécie vitis vinifera (uvas próprias para a produção de vinhos), tudo indica que a Cabernet Sauvignon é originária de Bordeaux, na França, uma das principais regiões vinícolas do mundo. Mas esse nome só começou a aparecer no final do século XVIII. Alguns historiadores sugerem que ela seria a Biturica, cepa mencionada pelo romano Plínio, o Velho, (23-79), em seus trabalhos científicos. Plnio era um historiador naturalista e oficial do Império Romano, que morou durante algum tempo na Gália – atual território da França.

O nome Biturica foi inspirado na tribo Bituriges, fundadora de Bordeaux. Existem produtores italianos que engarrafam hoje seus Cabernet Sauvignon chamando-os de Biturica e reivindicando a origem desta casta afrancesada. Há especulações também de que esta tinta seria a Petit Vidure ou Bidure, uma antiga uva de Bordeaux, originada do nome Vin Dure pela dureza de seu caule.

Independentemente do nome que possa ter tido no passado, uma coisa está provada: a origem genética da Cabernet Sauvignon. Em 1996, a Universidade da Califórnia, em Davis, realizou testes de DNA que foram conclusivos ao afirmar que a casta é um cruzamento da Cabernet Franc com a Sauvignon Blanc. O microscópio demonstrou que, além do nome sugerir sua origem, os aromas de frutas vermelhas da Cabernet Sauvignon lembram a Cabernet Franc, e os de ervas frescas nos remetem à Sauvignon Blanc.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon no Chateau Margaux

Vinhedos de Cabernet Sauvignon no Chateau Margaux

A Cabernet Sauvignon é a principal casta de Bordeaux. Apesar de não ser a mais plantada da região (a Merlot ocupa área maior) e também não ser a maior produtora do mundo em termos de volume (perde para o Languedoc – Roussilon), os tintos de Bordeaux são o modelo mais imitado em todo o globo. Por ser o componente principal de todos os cinco Premier Grand Cru Classés de Bordeaux, a variedade foi plantada nos quatro cantos do planeta e diversos dos melhores tintos do mundo são elaborados com ela.

A casta espalhou-se pelo mundo a partir dos anos 70, juntamente com o “padrão Bordeaux” – o famoso corte bordalês. Na América, a Cabernet Sauvignon passou a se tornar mais popular, como vinho tinto varietal, em meados dos anos 60. Sua popularidade baseou-se principalmente no sabor da uva e também no status de ser um vinho como os franceses de Bordeaux, que logo tornou-se objeto de fãs de vinhos e colecionadores novos ricos norte-americanos.

Adaptável a todos os terroirs

Cabernet Sauvignon

Cabernet Sauvignon: cacho em formato de T

Ao contrário das castas de terroir, que raramente vingam fora de sua região de origem, qualquer lugar sem calor ou frio extremos recebe muito bem a Cabernet Sauvignon. Ela só precisa de sol e da drenagem adequada para amadurecer – quanto mais úmido e frio o clima, maior deve ser a drenagem. Em Bordeaux, por exemplo, a Cabernet Sauvignon prefere os solos de cascalho, pois as pedras retêm o calor e proporcionam boa drenagem para escoar a umidade típica da região.

Em geral, podemos dizer que a Cabernet Sauvignon reflete menos o seu solo de origem do que castas mais sensíveis, como a Pinot Noir. Contudo, os grandes exemplares dessa cepa são inegavelmente verdadeiros vinhos de terroir. Um exemplo é o Don Melchor, ícone da vinícola chilena Concha y Toro, cujos vinhedos estão plantados em um dos 25 melhores terroirs do mundo.

Cabernet SauvignonDentre as principais características que classificam a Cabernet Sauvignon como soberana entre as uvas destacam-se a sua resistência contra pragas e excesso de chuvas, e o seu espetacular rendimento por hectare plantado, gerando maior quantidade de cachos sem perdas sensíveis de qualidade.

Como é uma planta de ciclo longo, a Cabernet é uma das últimas a sair do vinhedo (com exceção da Carménère, que é ainda mais tardia), por isso sua resistência e vigor são essenciais para suportar os verões chuvosos e alguns outonos que chegam particularmente frios, e tudo isso fica mais fácil se ela estiver em um solo bastante permeável.

No Brasil, ela se dá bem tanto em lugares altos e frios, como a Serra Catarinense, quanto em locais mais quentes e secos, como a Campanha Gaúcha. Mas a colheita na primeira região pode ser no mês de abril e até em maio, enquanto na Campanha acontece em março, geralmente.

Na Europa, principalmente na França, onde a Cabernet é a estrela dos cortes da maioria dos grandes vinhos de Bordeaux (entre eles o Château Margaux e o Latite-Rotschild), ela amadurece em outubro e novembro e precisa resistir às geadas da região.

Já nos Estados Unidos, onde fez sua fama em grandes produtos como o Stag’s Leap – o primeiro vinho das Américas a ser reconhecido como tendo a mesma qualidade de um dos grandes franceses em 1973 – ou na Robert Mondavi, a colheita pode ser um pouco mais cedo, devido ao calor da Califórnia.

Quanto mais cuidado, melhor o vinho

Cabernet Sauvignon

Cabernet Sauvignon: grande produção por vinha

A Cabernet Sauvignon amadurece duas semanas depois da Cabernet Franc e da Merlot e precisa de calor. Caso contrário, seu amadurecimento não será o ideal e, possivelmente, seus vinhos trarão aromas verdes e herbáceos lembrando muito pimentão verde, podendo ser exagerados e desagradáveis. A causa deste aroma é a Pirazina, substância presente nas uvas e que é destruída pela luz do sol.

 

Da próxima vez que provar um Cabernet Sauvignon e encontrar um aroma ou sabor muito forte de pimentão verde, você já sabe: a uva foi colhida antes da hora, não estava madura o suficiente!

 

Se por um lado a Cabernet Sauvignon precisa de algum calor, por outro, as temperaturas elevadas demais podem “cozinhar” as uvas e fazer o vinho ganhar aromas de geléias e perder acidez, tornando-se pastoso. O equilíbrio entre o herbáceo e a geléia – com uvas de boa maturidade e vinhos estruturados, mas com frescor – é o resultado almejado pela maioria dos produtores.

No ponto certo, essa uva é capaz de proezas, por ter sabor e aromas firmes, entregar aos vinhos estrutura e complexidade, e ainda por cima ser capaz de suportar (e evoluir) longos períodos em carvalho, pois aprecia o amadurecimento lento. A maturação tardia também contribui para a concentração de aromas, que podem variar por meio de uma extensa gama de frutados, herbáceos e minerais, conforme a região de plantio da videira e do processo de vinificação realizado.

Cabernet SauvignonA Cabernet Sauvignon possui cachos muito característicos, não muito pequenos e que em geral formam uma letra T, sendo alongados e parecendo compactos. Os bagos são pequenos, com a casca escura e grossa, que a faz mais resistente às doenças.

Ela produz vinhos de cor vermelho rubi intenso, escuro, aromas marcantes, diretos e fáceis de reconhecer, como os de algumas frutas vermelhas (cereja, cassis, framboesa), frutas negras (ameixa, groselha), especiarias (pimenta em pó, cravo), amadeirados (cedro, tostado, café) e herbáceos (menta, hortelã e pimentão).

Na boca, podemos dizer que ela tem uma “pegada” mais masculina, forte. Os bons vinhos apresentam acidez levemente destacada, com o álcool bem integrado, taninos potentes que ainda podem estar jovens, mas são sempre elegantes. A textura é envolvente, com corpo médio para maior. Quando o vinho ainda é jovem, a acidez e os taninos estão destacados; com o tempo, o vinho se mostra mais redondo, ganhando em complexidade.

Os tintos elaborados com essa uva são encorpados e concentrados, muitas vezes envelhecidos em carvalho, para que fiquem mais macios. Alguns de seus vinhos podem durar muito tempo, e podem também ser elegantes, enquanto outros são mais intensos e exuberantes.

O toque de elegância dos Assemblages

Assim como a maioria das uvas tintas, a Cabernet Sauvignon pode ser apresentada sozinha (varietal) ou em cortes (assemblages). Em ambos os casos, ela dá origem a vinhos estruturados, concentrados e tânicos. Os cortes mais frequentes são com a Merlot ou Cabernet Franc (Bordeaux), com a Sangiovese (Toscana), com a Tempranillo (Espanha), com a Syrah (Austrália) e novamente com a Merlot (Estados Unidos e Chile). Nos cortes, ele é responsável pela longevidade, estrutura e complexidade. Outra característica interessante dessa casta é que o uso de madeira, com o estágio em barricas de carvalho, favorece a complexidade aromática.

Cabernet Sauvignon

Cabernet Sauvignon: usada em cortes, garante vinhos mais elegantes

O corte com a Cabernet Sauvignon contribui para modernizar o estilo de vinhos de castas mais simples, muitas vezes rústicas e de sabor exótico, que se beneficiam quando misturadas à essa cepa, ganhando um toque internacional, além de potência no produto final. Mesmo em proporções pequenas, a Cabernet é fácil de ser reconhecida, com aromas e sabores que se destacam.

Ao mesmo tempo em que é marcante, é também versátil. Gera tintos de grande cor e corpo, tintos leves, rosés, espumantes e até brancos. Existem Blanc de Noirs (espumantes produzidos exclusivamente com uvas tintas) feitos com Cabernet Sauvignon de origem israelense.

O fato de ser tão eclética nos permite degustá-la jovem ou não. Tudo depende da região e do estilo do vinho que o produtor quis apresentar. O tempo de guarda está diretamente relacionado ao estilo do produtor ou região, mas em linhas gerais é de 5 a 10 anos (vinhos mais simples), de 10 a 15 anos (australianos), de 10 a 20 (californianos) e mais de 30 anos (tops de Bordeaux). Existem vários exemplares da primeira linha de Bordeaux com mais de 40 anos que ainda estão em plena forma!

Grandes vinhos que levam Cabernet Sauvignon em sua composição

Grandes vinhos que levam Cabernet Sauvignon em sua composição

A Cabernet pelo mundo

Aqui começa a nossa viagem. Como dissemos anteriormente, a Cabernet Sauvignon saiu da França e espalhou-se pelos cinco continentes. Em cada um deles, ganhou uma expressão diferente e misturou-se com outras uvas, como na Itália com a Sangiovese e na Espanha com a Tempranillo. Mas sua grande popularidade deve-se mesmo aos varietais de enorme qualidade vindos dos Estados Unidos, Chile, Argentina e Austrália – e mais recentemente do Brasil, que tem produzido excelentes exemplares.

França: o corte bordalês

Os mais famosos vinhos Cabernet Sauvignon são os da região de Bordeaux, na França. Além de ser o berço desta casta, os vinhos da região tornaram-se mundialmente conhecidos e estão, até hoje, no topo do ranking dos melhores vinhos tintos do mundo, fazendo com que o modelo de vinho de corte de Bordeaux seja copiado mundo afora.

Tradicionalmente os franceses misturam a Cabernet Sauvignon com a Merlot e a Cabernet Franc, produzindo vinhos encorpados, longevos e complexos. Esse é o famoso “corte bordalês”.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon no Chateau Smith Haut Lafitte

Vinhedos de Cabernet Sauvignon no Chateau Smith Haut Lafitte

Os vinhedos bordaleses se estendem por todo o estuário do rio Gironde e dos rios Garonne e Dordogne. Falar em Bordeaux é falar de Margem Esquerda e de Margem Direita. Do lado esquerdo predomina a Cabernet Sauvignon e, do lado direito, a Merlot e a Cabernet Franc. Independentemente da margem, raramente os tintos de Bordeaux são feitos com uma só uva. Um dos motivos é o clima, que pode variar muito de ano a ano. Assim, se o clima não foi propício para Cabernet Sauvignon em certa safra, existe a possibilidade da Merlot ter sido melhor e dar ajuda no corte. Por isso, é praticamente impossível encontrar um exemplar varietal de Cabernet Sauvignon francês.

Os grandes ícones da margem esquerda – Châteaux Latour, Lafite, Margaux, Mouton e Haut Brion – são elaborados com predomínio de Cabernet Sauvignon, mas também com proporções variáveis das outras uvas da região, que são: Merlot, Cabernet Franc, Petit Verdot, Malbec e Carmenérè. A fórmula do corte bordalês é unir a força da Cabernet Sauvignon com a gordura no meio de boca da Merlot e os perfumes da Cabernet Franc. A Petit Verdot é uma uva de difícil cultivo, muitos produtores sequer a usam e, quando usam, raramente sua proporção passa dos 5%, dando cor escura e aromas de violetas ao vinho. A Malbec e a Carmenère são permitidas, mas também pouco utilizadas.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon no Chateau Margaux

Vinhedos de Cabernet Sauvignon no Chateau Margaux

Em termos de estilo, os tintos bordaleses com predominância de Cabernet Sauvignon tendem a ser encorpados, longevos, austeros quando jovens, com aromas de frutas, como cassis e amoras, minerais (grafite, ferrugem, terra molhada), além de violetas, cedro e caixa de charuto.

Outra região francesa com grande área de Cabernet Sauvignon é o Languedoc, no sul do país, com cerca de 11 mil hectares plantados. Ali, o estilo geral é de vinhos mais frutados e macios. Há ainda boa presença da casta no Sudoeste – em um estilo mais bordalês, porém com mais leveza –, e na Provence, onde a Cabernet Sauvignon, por vezes, é misturada à Syrah.

Itália: nascem os Supertoscanos

Fora de Bordeaux, as maiores expressões da Cabernet Sauvignon no Velho Mundo vêm da Itália. Há controvérsias de quando a casta teria aparecido no país. Alguns acreditam que ela está ali desde o Império Romano, quando era chamada por Plínio, o Velho, de Biturica, ou no início do século XIX, no Piemonte – região de assumida influência francesa, evidenciada no dialeto local.

Durante muito tempo, a Cabernet Sauvignon foi misturada, desde os vinhedos, com a Cabernet Franc, que predominava no norte da Itália, e muitos vinhos regionais traziam nos rótulos apenas a palavra Cabernet. Quando apareceu na Toscana, a Cabernet Sauvignon causou a revolução dos Supertoscanos, que suscitou amor e ódio.

Os “Supertoscanos” foram assim chamados porque, na época em que começaram a ser produzidos, o uso de uvas estrangeiras era proibido. Além disso, como eram produzidos com uvas não permitidas na região, os vinhos não podiam usar a denominação de Chianti – o vinho que fez a fama da Toscana. Os produtores destes vinhos estavam autorizados, apenas, a usar a classificação mais baixa dos vinhos italianos, que é “vino da tavola”. Mas os ingleses e americanos reconheceram a excelente qualidade desse novo vinho e os apelidaram de “Supertoscanos”, para diferenciá-los dos “vino da tavola”.

Vinhedos na Toscana

Vinhedos na Toscana

O responsável pelo nascimento desses novos vinhos foi o Marquês Piero Antinori, atualmente o mais famoso produtor de vinho da Toscana e produtor do prestigiado Solaia, que ganhou o prêmio de melhor vinho do ano pela revista Wine Spectator (Solaia 1997, vinho do ano em 2000). Em 1971, Antinori, 26ª geração de uma família de vinhateiros, fez a primeira colheita de seu vinho Tignanello bem no meio da região do Chianti Clássico, com 15% de Cabernet Sauvignon e 5% de Cabernet Franc misturadas à principal casta local, a Sangiovese, o que era uma heresia para os produtores de Chianti.

Depois do reconhecimento da excelência de qualidade desses novos vinhos, o cultivo da Cabernet Sauvignon deixou de ser proibido, a uva passou a ser cultivada de forma ampla e a região passou a ser reconhecida mundialmente pela produção dos prestigiados “Supertoscanos”.

Desde então, surgiram muitos toscanos com a uva Cabernet Sauvignon, que alcançaram qualidade, fama e alto preço, como o Solaia e o Sassicaia. Os melhores exemplares da Toscana chegam a grande complexidade e profundidade de aromas e sabores, com bom equilíbrio e acidez. O casamento da Cabernet Sauvignon com a Sangiovese, por vezes, rende vinhos excepcionais.

O Piemonte, região bem mais conservadora que a Toscana, não ficou de fora desta onda. Em 1978, outro grande nome da enologia italiana, Angelo Gaia, colheu seu primeiro Cabernet Sauvignon de um vinhedo originalmente dedicado ao Barbaresco. O Darmagi – o nome vem da palavra francesa domage que, no dialeto piemontês significa “que pecado” –, além de grande vinho, tornou-se um ícone da renovação da enologia piemontesa.

Hoje, a Cabernet Sauvignon está em quase todas as regiões italianas (Lombardia, Emilia Romagna, Friuli, Veneto, Trentino, Alto Adige, Sicília, Campânia, Úmbria, Sardegna etc), pura, em cortes bordaleses ou misturada a uvas locais como, por exemplo, Aglianico, Nero D´Avola, Cannonau. A Cabernet Sauvignon também já é reconhecida oficialmente em várias DOCs italianas, como Langhe e Monferrato (Piemonte), Carmignano (Toscana), Colli Bolognesi (Emilia Romagna), Trentino, Lison-Pramaggiore (Veneto), Colli Orientali Fruili, Collio, Grave del Friuli e Isonzo.

Espanha: compondo grandes vinhos

Na Espanha, a Cabernet Sauvignon também está disseminada em quase todas as regiões, embora muitas vezes plantada em pequenas quantidades e sem muita expressão. Um pioneiro no uso dessa casta em território espanhol foi a tradicional bodega Marques de Riscal, da Rioja, que mistura a casta francesa com as locais desde o século XIX.

Vega-Sicilia UnicoOutro precursor foi a Bodega Vega Sicília, fundada em 1864 por Eloy Lecanda y Chaves, mas que viria a lançar seu vinho ícone, o Vega Sicilia Único, apenas em 1915. Este, que é historicamente o mais prestigioso vinho da Penísula Ibérica, conta com Cabernet Sauvignon em seu corte.

A partir dos anos 1960, Miguel Torres, outro importante produtor espanhol, adotou a uva levando-a à região de Penedés, próxima a Barcelona. Assim, tornou seu tinto Mas La Plana o Cabernet Sauvignon varietal mais conhecido da Espanha. Hoje, outra região onde a tinta se adaptou bem é Navarra e, por todo o país, surgem bons exemplares de vinhos tintos com essa uva, geralmente em bons casamentos com a casta mais importante do país, a Tempranillo.

Portugal: pouca presença

Portugal não ficou imune ao contágio da rainha das uvas, embora esta “epidemia” não tenha se alastrado. O caso mais notório é a predominância de Cabernet Sauvignon no Quinta da Bacalhôa, lançado no final dos anos 1970 pela JP Vinhos, da Península de Setúbal, elaborado pelo enólogo australiano Peter Bright.

Hoje, a empresa mudou de dono e de nome, chama-se Bacalhôa Vinhos de Portugal, Bright deixou a casa e tem sua própria empresa no Ribatejo. E o vinho Quinta da Bacalhôa ganhou um irmão maior, o Palácio da Bacalhôa, um corte de bordalês com predomínio de Cabernet Sauvignon feito apenas nos melhores anos.

No resto do país, a Cabernet Sauvignon marca presença com alguns bons vinhos na Estremadura, Ribatejo e Alentejo, mas quase sempre em pequenas porcentagens nos cortes com castas autóctonas, como a Touriga Nacional ou Aragonês.

Outros países do Velho Mundo

Leste europeu, norte da África e Oriente Médio possuem enormes áreas de Cabernet Sauvignon. Bulgária e Romênia juntas rivalizam com Bordeaux em área plantada dessa casta. Países como Moldávia, Hungria, Grécia, Líbano, Turquia e Israel também fazem seus Cabernet Sauvignon, alguns chegando a ter ótima qualidade.

Estados Unidos: a queridinha da Califórnia

O Estado da Califórnia destaca-se no mundo do vinho não só por causa da grande quantidade produzida, mas também pela excelente qualidade de seus vinhos, que são conhecidos e respeitados mundialmente. Depois de Bordeaux, Napa Valley é a principal região produtora de Cabernet Sauvignon e de alguns dos melhores rótulos do chamado “Novo Mundo dos Vinhos”. Essa região foi reconhecida mundialmente como excelente produtora de vinhos em 1976 quando, em uma competição de vinhos em Paris, alguns deles ganharam dos tradicionais vinhos da Borgonha e de Bordeaux.

Desde então, o investimento em pesquisas e na melhora da qualidade só fizeram com que o reconhecimento dessa região fosse cada dia maior. A influência francesa na enologia norte-americana é evidente. O padrão é, principalmente, de Bordeaux, buscando imitar o estilo gaulês nos mínimos detalhes. Napa Valley é a região principal para Cabernet Sauvignon, mas Sonoma, principalmente no Alexander Valley, também gera ótimos exemplares – assim como outras novas regiões, como Mendocino e Paso Robles. Em mistura com a Merlot e a Cabernet Franc, recebe o nome de Meritage.

No restante do país, esta tinta está sempre presente, embora com menor expressão – como nos Estados de Washington, Oregon, Texas e Arizona – e, geralmente, os vinhos são mais alcoólicos, frutados e amadeirados. Infelizmente, a presença dos bons californianos ainda é muito pequena no Brasil, principalmente por conta do alto consumo norte-americano.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon em Napa Valley

Vinhedos de Cabernet Sauvignon em Napa Valley

Austrália: terceiro produtor mundial

Outro grande produtor de bons vinhos é a Austrália. Atualmente esse país tem mais de 2.000 vinícolas espalhadas por toda a sua extensão e está entre os cinco maiores exportadores de vinho do mundo, apesar de seus exemplares serem ainda pouco conhecidos em nosso país.

Com enorme variedade de uvas – a Austrália produz mais de 100 tipos – a Cabernet Sauvignon está presente em quase todas as regiões e com ela são produzidos excelentes vinhos, como o Penfolds Cabernet Sauvignon Barossa Valley Kalimna Block 2004 e o Penfolds Cabernet Sauvignon South Australia Bin 2010, que receberam nota 97 da Wine Spectator.

Quase 22 mil hectares de Cabernet Sauvignon colocam a Austrália como a terceira produtora mundial desta casta. A região mais importante é Coonawarra, no sul do país, onde é encontrada Cabernet Sauvignon de grande estrutura, potente e com frescor mentolado muito típico, produzindo exemplares robustos.

Margaret River, no extremo oeste da Austrália, é uma região descoberta há poucas décadas como um grande terroir para a casta, gerando vinhos complexos e equilibrados, mais ao estilo bordalês. Isso conferiu à região o apelido de Bordeaux Australiana.

Outras áreas de expressão são o Yarra Valley, com vinhos mais elegantes; Clare Valley, que produz exemplares encorpados e de muito frescor; e Barrosa Valley, com vinhos encorpadíssimos e largos – todas elas no sul do país.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Chile: casta mais cultivada do país

Embora a Carmenérè seja a uva emblemática do Chile, é a Cabernet Sauvignon que gera a maioria dos grandes vinhos do país, considerados por muitos os melhores vinhos tintos da América Latina. Os 21 mil hectares plantados ali confirmam a boa adaptação desta casta em várias regiões, como Maipo, que produz um estilo clássico e encorpado; Curicó, mais macios e com taninos doces; Colchágua, de acidez mais moderada, taninos macios e fruta doce; e Aconcágua, com vinhos estruturados, mas com taninos doces.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

No Chile podemos dizer que a Cabernet Sauvignon encontrou um terreno fértil para se desenvolver com muita personalidade. É a casta mais cultivada no país e praticamente todos os produtores a vinificam. Como a produção é alta, a uva adquire características vegetais que distinguem o vinho chileno de todos os outros que são feitos com essa mesma casta, fazendo com que os especialistas os reconheçam imediatamente.

A Concha Y Toro, maior vinícola local, é tida como a proprietária do maior vinhedo próprio de Cabernet Sauvignon. Já o vinho Cousiño Macul Lota 2009, feito com 70% de Cabernet Sauvignon, foi eleito pelo Guia Descorchados 2015 como o Melhor Vinho Tinto Chileno!

Argentina

Quando se fala em Argentina, logo o Malbec vem à mente. Mas seus Cabernet Sauvignon também são dignos de nota.

As primeiras mudas dessa casta chegaram a Mendoza por volta de 1860, mas não tiveram a preferência dos imigrantes italianos da região. A evolução foi tão lenta que, passados 130 anos, a área cultivada não chegava a 3 mil hectares. A partir de 1990, entretanto, com a chegada de investidores estrangeiros e a necessidade de a Argentina competir internacionalmente, houve uma rápida evolução e, hoje, a área de Cabernet se estende por 20 mil hectares.

Como a uva Malbec, que adquire a sua própria personalidade dependendo da latitude e altitude, a Cabernet Sauvignon argentina é igualmente impressionante, com suas próprias características, dependendo se é cultivada em altitudes elevadas ou em vales mais quentes.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

As áreas mais significativas são as de Salta, no norte, e Rio Negro, na Patagônia, no sul, onde a Cabernet Sauvignon não tem as notas verdes características do Chile, que fica do outro lado da Cordilheira. Na Argentina, onde cresce sob a influência de um clima continental quente de alta insolação, a uva mostra tempero e suculência, com notas de fruta preta madura e sensações de fumo e chocolate escuro. É profunda e aromática.

Para grande parte dos produtores argentinos, a Malbec tem sido certamente uma maneira de aproximar o consumidor internacional, graças ao fato de que é fácil de beber e, com certeza, existem rótulos de excelente qualidade. Mas a Cabernet Sauvignon será sempre a rainha e mãe dos grandes vinhos da história.

Outros países do Novo Mundo

Ao redor do mundo, podemos citar outros países com boa área plantada e qualidade de Cabernet Sauvignon, como África do Sul, que produz excelentes exemplares em Stellenbosch, com estrutura e peso; Uruguai, de vinhos mais pesados, puros ou em cortes com a Tannat; e Nova Zelândia, principalmente em Hawkes Bay, de estilo mais elegante, com frescor de ervas, puros ou em cortes bordaleses.

Em cada país, a Cabernet Sauvignon adquire uma identidade, trazendo em seus vinhos toda a cultura do terroir, do cuidado na produção e da criatividade do enólogo. É uma casta extremamente versátil.

E no Brasil, tem Cabernet?

Os registros são imprecisos, mas acredita-se que as primeiras mudas de Cabernet Sauvignon chegaram ao Brasil por volta de 1900. No entanto, seu plantio de forma regular não aconteceu até o começo de 1970, com a entrada de multinacionais no País.

Hoje, a Cabernet Sauvignon é a principal uva tinta vinífera do Brasil, ao lado da Merlot. Está em todas as regiões vinícolas brasileiras e tem diferentes características devido à sua adaptação aos terroirs e ao nosso regime de chuvas, que às vezes prejudica sua maturação lenta. Na Serra Gaúcha, os varietais de Cabernet tendem a ter um estilo europeu, com menor grau alcoólico, delicada estrutura e mais cor. Já na Campanha Gaúcha, os vinhos são mais complexos e estruturados, com coloração mais suave e mais alcoólicos, ao estilo do Novo Mundo.

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Vinhedos de Cabernet Sauvignon

Em Santa Catarina, estão os Cabernet Sauvignon com maior potencial de envelhecimento, acidez mais alta e taninos mais firmes. O desafio é conseguir a maturação completa dos cachos, para conter os aromas desagradáveis do pimentão verde (Pirazina). No Paraná, os vinhos tendem a ter estrutura média, cores mais firmes e em geral pedem o envelhecimento em carvalho. Já no Nordeste, onde o calor é excessivo, a Cabernet Sauvignon normalmente precisa de um corte com outra uva para ganhar mais cor, geralmente misturando-se à Syrah ou Alicante Bouschet.

 

Os packs que preparamos para o evento de agosto da Confraria Viva o Vinho, em parceria com a Wine in Pack, vão proporcionar uma viagem pelo mundo da Cabernet Sauvignon. Cada um deles, com duas ou três garrafas, trarão vinhos de países diferentes – Brasil, Argentina, Chile ou Espanha –, para que os confrades que entrarem na brincadeira possam sentir a diferença de aromas e sabores de cada país, com a mesma uva.

 

Um pouco mais sobre Cabernet

Estamos trazendo também em nossos packs um brasileiro varietal de Ruby Cabernet. Essa casta foi criada na Califórnia, resultante do cruzamento entre Cabernet Sauvignon e Carignan, e pode produzir vinhos com boa cor e um sabor de cereja agradável.

A Ruby Cabernet é uma casta da espécie vitis vinífera, criada em laboratório na Universidade da Califórnia, pelo Dr. Harold Olmo (1909-2006), um professor de viticultura que desenvolveu mais de 30 novas variedades, ao longo dos seus 50 anos de carreira. Suas cepas ficaram conhecidas como “uvas de Olmo”. A Ruby Cabernet foi oficialmente lançada em 1948.

Ruby Cabernet

A Ruby Cabernet

O objetivo foi obter um vinho com sabor próximo ao Cabernet, mas com videiras mais tolerantes a climas quentes. Ela é cultivada, principalmente, nos Estados Unidos, na Austrália, e na África do Sul, e também na Argentina e no Chile. No Brasil, é cultivada na região do Vale do São Francisco, onde é produzido o único Ruby Cabernet varietal do país.

Os bagos da Ruby Cabernet são de tamanho médio, de formato redondo mas levemente ovalados, de cor roxa escura, e com um sabor típico de Cabernet Sauvignon. Eles se juntam em cachos não muito apertados, de tamanho relativamente grande, de formato cônico e longo.

Trata-se de uma variedade muito produtiva, que deve ser controlada para que não haja perda de cor, nem atraso na colheita. É uma variedade que, na prática, mostrou-se exigente, precisando da dedicação e do trabalho duro de quem a cultiva.

Com rendimentos controlados, a Ruby Cabernet é capaz de produzir vinhos de elevada qualidade e boa performance de cor. Os aromas mais associados ao vinho produzido a partir da Ruby Cabernet são frutas vermelhas em geral, especialmente cerejas.

Apesar de ser mais comum em cortes, vale a pena buscar um varietal de Ruby Cabernet, para conhecer a graça dessa uva. É como um Cabernet Sauvignon menos encorpado, menos alcoólico, mais gentil e mais fácil de beber, ainda que continue mantendo taninos bem marcados.

Participe do nosso evento!

Aprendeu tudo sobre a Cabernet Sauvignon? Então já deixem anotado na agenda!

9º Evento Confraria Viva o Vinho

Data: 26 a 28 de agosto de 2016

Local: Grupo Viva o Vinho no Facebook

Tema: Cabernet Sauvignon

Mais informações: Confraria Viva o Vinho (todas as informações sobre como participar e os packs do evento agora estarão nesta página)

Se tiverem qualquer dúvida, postem nos comentários aqui. Esperamos por vocês!

Cabernet Sauvignon

 

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